Completados 30 dias do início da implantação do Plano Responsável de Abertura das Atividades Econômicas e Comportamentais pelo Governo do Estado, o setor produtivo cearense ainda lista dificuldades enfrentadas e prejuízos acumulados, mas também se surpreende com desempenhos positivos e sinais de melhora já observados.

Representante de um dos setores mais afetados pela restrição das atividades, Freitas Cordeiro, presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Ceará (FCDL-CE), aponta que um dos comportamentos não esperados foi o decréscimo no nível de infecção em Fortaleza, mesmo com a flexibilização. “Surpreendentemente, Fortaleza passou das primeiras fases com decréscimo (de casos), o que não tem ocorrido em outros locais do País. A situação ainda está problemática no Interior, mas a Capital deu exemplo. Acreditamos que a terceira fase vai ser implantada sem problemas”, prevê Cordeiro.

Segundo ele, outro alento para o setor foi o pacote de incentivo às empresas lançado pelo Governo do Estado na última quinta-feira (25). “O foco anterior estava na saúde, o que não é uma coisa ruim, mas ainda não havia tido uma sinalização para a proteção da economia. Então, foi muito bom”, avalia.

O presidente da FCDL-CE ainda revela que, durante a reabertura do comércio, está havendo significativa procura diante de uma demanda reprimida e mediante a injeção de recursos por meio de programas emergenciais do Governo Federal para manter a renda das famílias. Ele aponta que, enquanto o setor de confecção ainda apresenta dificuldades para engatar uma retomada, outros estão conseguindo bater metas com o auxílio de ferramentas como o delivery.

“Eu costumo dizer que somos um paciente de UTI ainda sob efeito da anestesia. Estamos em um estado de letargia. Passamos pelo pior no tocante à saúde, mas ainda estamos entrando no pior da crise econômica”, alerta Cordeiro.

Confecção

O presidente do Sindicato das Indústrias de Confecções e Chapéus de Senhora no Estado do Ceará (SindConfecções), Elano Guilherme, admite que o segmento apresenta dificuldades para retomar o trabalho, se adequar aos protocolos exigidos para a reabertura e para engatar o ritmo novamente com um número reduzido de funcionários. “Essa limitação, esse número reduzido de funcionários, atrapalhou que a gente colocasse as empresas nos trilhos”, argumenta.

Em termos de vendas, ele estima que o setor atingiu 50% do observado em um período normal. “Havia uma demanda reprimida e, mesmo sendo um número pequeno de pessoas indo às lojas, quem vai, efetiva a compra. Nos surpreendeu positivamente”. Guilherme teme, no entanto, que a euforia se encerre juntamente com as medidas de assistência econômica que o Governo Federal vem dando à parte da população.

“Também nos preocupamos que as restrições (do isolamento social) não voltem. Estamos tomando todas as medidas para que o quadro não agrave novamente. Caso tenhamos que fechar, vai ser um abalo gigantesco. Dia 6, retornamos com 100% da capacidade e esperamos crescimento do consumo. Até o fim do ano, estimamos estar com a mesmo capacidade de venda anterior à pandemia”.

Ele ainda revela que a maioria das indústrias está terceirizando parte da mão de obra e reduzindo o quadro interno de funcionários. O presidente do SindConfecções detalha que estão sendo mantidos os setores de criação, corte e modelagem, transferindo a montagem das peças para pequenas e médias facções.

Construção civil

No sentido contrário, a construção civil se encontra em um cenário de juros baixos favorável à recuperação, segundo o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Ceará (Sinduscon-CE), Patriolino Dias. Ele revela que a procura pela compra de imóveis melhorou consideravelmente nos últimos dez dias, animando o setor.

“No início do ano, nós estimávamos R$ 2 bilhões de VGV (Valor Geral de Vendas) no Ceará, referente a lançamentos. Por conta da pandemia e o adiamento de alguns deles, essa previsão caiu para R$ 1 bilhão. Mas caso essa procura continue, pode ser que seja mais”, afirma.Ela ainda prevê que as vendas aconteçam cada vez mais por meio digital, tendência que já iniciou durante o isolamento social e deve se fortalecer. “O consumidor olha o material digital, recebe o contrato virtualmente e já assina pelo meio eletrônico também. Uma coisa que a gente achava que fosse acontecer apenas no final de 2021, início de 2022”, destaca.

O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Ricardo Cavalcante, lembra que nem toda a indústria parou durante as restrições, mantendo-se ativa a parte que supre as demandas dos produtos essenciais. Na parcela que foi afetada e que agora retomada, ele aponta a dificuldade de acesso ao crédito como um dos principais gargalos a serem sanados. “Mesmo com as linhas emergenciais de crédito instituídas pelo Governo Federal, o índice de liberação desses recursos tem sido insignificante para o montante necessário à retomada das atividades. Isto resolvido, tudo o mais se resolve, uma vez que a indústria começa a comprar de seus fornecedores os insumos necessários, passa a produzir e com isso oferecer trabalho, remunerar seus funcionários, alimentar os canais de distribuição, movimentar o mercado e dar uma nova dinâmica à economia”, aponta.

Alimentação

Autorizado a reabrir parcialmente na semana passada em Fortaleza, o segmento de alimentação fora do lar registra faturamento de cerca de 30% de um período normal. Segundo Taiene Righetto, diretor executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) no Ceará, o período foi suficiente para tirar algumas lições.

“A primeira delas é que as pessoas estão realmente cautelosas. Os três primeiros dias foram bem abaixo (do esperado), justamente por essa cautela. Depois, as pessoas passaram a se sentir mais seguras, começaram a repassar boca a boca que realmente os protocolos estão bem rigorosos, e a movimentação aumentou um pouco”, explica.

Para ele, o principal desafio de agora em diante será manter as regras de segurança em um nível elevado, tendo em vista que elas custam caro e as empresas estão fragilizadas devido aos meses praticamente sem faturamento.

Pequenos negócios

Devido à própria estrutura, os pequenos negócios têm sofrido mais em relação às empresas de maior porte. Segundo levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), 61,6% dos pequenos negócios no Estado tiveram de interromper temporariamente as atividades por conta da pandemia, enquanto 2% encerraram definitivamente.

“Esse percentual pode parecer pequeno, mas temos 526 mil empresas no Estado cadastradas no Simples Nacional, o que corresponde a mais de 15 mil empresas já fechadas. Considerando que cada negócio tem duas pessoas trabalhando, são 30 mil cearenses que perderam seus empregos ou negócios”, alerta Alci Porto, diretor técnico do Sebrae Ceará.

O levantamento ainda revela que 78,6% das empresas sofreram redução de 68%, em média, no faturamento. “Nós observamos que as empresas no Ceará tiveram mais dificuldade em se inserir no meio digital que o Nordeste e o restante do Brasil. E caso não tenhamos um acesso mais fácil ao crédito, essas empresas que fecharam temporariamente e pretendem reabrir podem não conseguir, multiplicando até por dez esses 2% que já encerraram definitivamente”.

Ainda assim, Porto aponta que alguns segmentos conseguiram se fortalecer durante a pandemia, como o de TI. “Cerca de7% das empresas conseguiram aumentar o faturamento, como comunicação, marketing digital, a cadeia de saúde e parte do setor de alimentação, graças ao delivery e à rede que se formou nos próprios bairros”, aponta.

Fonte: Diário do Nordeste